Caro AJC
As lente dos óculos correctivos estão mais perto do olho do que a primeira lente da ocular, "chamada de lente de olho", pelo que não precisa de ser tão grande como essa outra lente da ocular. As lentes de contacto, por exemplo, têm uns 12 mm a 13 mm de diâmetro e só com isso abrangem toda a visão possível, precisamente por estarem tão próximas do olho. Portanto, a lente dos óculos pode ser bem menor.
É certo que as melhores imagens que o olho podem ver são as que caem na mancha amarela (na retina), que cobre pouco mais de 1º. Mas o olho fixo (sem rodar o globo ocular) pode abranger simultaneamente um campo de uns 45º a 50º. Isto com o olho estático, olhando em frente. No entanto, campos maiores permitem:
a) que o olho percorra a paisagem sem ser preciso deslocar a pontaria do telescópio;
b) dispor de maior campo real, o que facilita apontar e localizar astros menos fáceis, por exemplo objectos do céu profundo;
c) manter durante mais tempo um objecto no campo de visão, sem mover o telscópio (por exemplo em telescópios sem seguimento, especialmente nos dobsonianos) e nos equatoriais não motorizados);
d) enquadrar simultaneamente no campo visual objectos de grandes dimensões aparentes: M31, ou conjuntos de obectos próximos entre si como o Enxame duplo do Perseu, ou os enxames abertos extensos (por ex. M45), etc.
e) observar simultaneamente um objecto e outros objectos vizinhos, sem necessidade de mover o telescópio; se a ocular for boa, e a nitidez se mantiver até quase à borda do campo, o olho pode rodar e colocar na melhor região da retina um objeto que esteja até desviado do centro do campo da ocular;
Por todas estas razões, há uma grande diferença e muito maior agrado quando se passa de uma boa ocular de 50º para uma boa ocular de 68º ou 70º;. Não noto já tanta diferença ao passar de uma de 68º para uma de 84º.
De facto só há um caso a evitar: é utilizar oulares de grande campo aparente (>70º) com amplificações tão baixas (demasiado baixas) que levem a pupilas de saída iguais à máxima pupila do olho(*). Nesse caso, com o olho centrado, olhando o centro do campo da ocular, a pupila de saída coincide em centro e em diâmetro com a pupila do olho do observador; mas se este observador quiser olhar para a borda do campo, ele irá rodar o seu globo ocular e então, a pupila do olho desvia-se lateralmente (**) e deixa de estar centrada com a pupila de saída. Então, a pupila de saída é diafragmada pela própria pupila do olho: estamos perdendo luz, pois embora a pupila do olho tenha, digamos 6,5 mm de diâmetro e a pupila de saída tenha também 6,5 mm de diâmetro, o facto de elas não estarem centradas dá origem a uma área útil (intersecção)bem menor, em forma de fuso***.
Trata-se de uma forma particular de "vignetting" na observação visual: é como se a abertura efectiva do telescópio diminuísse progressivamente à medida que olhamos para regiões mais afastadas do centro do campo da ocular.Este é um facto pouco conhecido, mas muito real. Se desenhar duas circunferências de, digamos 5 cm de diâmetro, se os centros delas estiverem a 3 cm um do outro verá que a área de intersecção, é bem pequena, bastante menor do que a área de um círculo de 5 cm de diâmetro!!!
Para observações de pormenor (o que não é o caso do céu profundo) nunca se devem usar pupilas de saída grandes, mesmo que a pupila do olho seja grande. As regiões marginais da pupila humana são de mais baixa qualidade óptica do que a região central. O olho só pode ser considerado como um instrumento de óptica praticamente perfeito quando a pupila do olho utilizada tem menos de 1 mm de diâmetro.
O olho só atinge um índice de Strehl de 80% (o limite mínimo para ser só limitada pela difracção) quando a pupila do olho tem menos de 2 mm de diâmetro). Quando a pupila do olho mede mais de 5 mm de diâmetro, o olho é um mau instrumento de óptica. O seu índice de Strehl é bastante fraco, devido às imperfeições de curvatura das regiões marginais da córnea, que prejudicam a formação de boas imagens e ainda, adicionalmente, devido às aberrações do olho que se intensificam nesse caso (grande abertura da pupila), sobretudo aberração de esfericidade, coma e algum astigmatismo.
Quanto ao seu astigmatismo (o dos seus olhos), se utilizar pupilas de saída de 0,5 mm a 0,8 m quase de certeza que o seu astigmatismo não se vai refectir nas observações, pois aí o AJC estará usando as regiões centrais da sua córnea (e o astigmatismo é causado sobre tudo pela má curvatura das regiões periféricas da córnea). Experimente e conte o resultado.
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NOTAS:
* O caso em que a pupila de saída é ainda maior que a pupila do olho deve ser evitado, pois perde-se luz e a magnitude limite alcançada será menor (é como se o telescópio perdesse abertura). Se for um telescópio obstruído, a sombra da obstrução (também existente na pupila de saída) pode tapar parte significativa da pupila do olho e causar dficuldades de observação, além de também se perder luz.
** A pupila do olho desvia-se porque o centro de rotação do globo ocular ficam muito atrás da córnea do olho!!!. Rodando o globo ocular, a pupila desvia-se lateralmente (veja o seu olho num espelho).
*** Por esta razão, oculares de mais de 70º de campo só deveriam ser utilizadas com pupilas de saída até 4 mm... 4,5 mm de diâmetro e não mais do que isso.
Boas observações
Guilherme de Almeida